terça-feira, 26 de julho de 2011

Estudo para os da beyth de Yochanan ben Avraham

O Filho - Parte I
Por Sha’ul Bentsion


I - Introdução

Dois dos conceitos mais importantes sobre o Mashiach repousam sobre o fato de que Ele é chamado de “filho do homem” e também de “Filho de Elohim”.

Mas, o que significam essas expressões? É surpreendente que dois conceitos tão fundamentais sejam pouco estudados. E pior: São fonte de dúvida, pois muitos se perguntam: Como pode Yeshua ser o próprio Eterno, e ainda ser Seu Filho? Isso é realmente possível?

Para responder a essa, e muitas outras questões associadas a esse tema, é preciso buscar a compreensão semita do conceito de “filho”.

Nos tempos bíblicos, a filiação, isto é, o ser filho de alguém, era um conceito distinto do que é hoje.

Na nossa cultura, um filho significa alguém gerado biologicamente ou, no máximo, uma pessoa adotada ou perfilhada. Esse é o limite da definição corrente. Embora possa haver outros usos de conotação mais poética, tais usos são raros na cultura ocidental da atualidade.

Nos tempos bíblicos, o uso do termo ‘filho’ era muito diferente. Embora o termo fosse aplicado a filhos biológicos e adotivos, na realidade o conceito era muito mais abrangente do que isso. Podia representar um parentesco bem mais distante do que a filiação direta, e poderia até mesmo ser aplicado em diversas figuras de linguagem, com diferentes idéias.

É exatamente esse conceito semita que será investigado neste material, que se propõe a fazer um estudo profundo sobre a expressão e suas implicações semânticas.


II - Conceito de Parentesco

Na própria Bíblia, é possível observar exemplos de que o parentesco não era apenas biológico. Aqueles que nascessem aos cabeças de uma casa poderiam ser considerados seus filhos, mesmo que nascidos de outros pais, e mesmo a parentes mais distantes.

Observa-se, inclusive, que os laços parentais eram bem mais relativos do que hoje em dia. Por exemplo, tem-se o diálogo de Lavan (Labão) e Ya’akov:

“Também não me permitiste beijar os meus filhos [levanai] e as minhas filhas [ulivnotai]. Loucamente agiste, agora, fazendo assim.” (Bereshit/Gênesis 31:28)

“Então respondeu Lavan, e disse a Ya'akov: Estas filhas [banot] são minhas filhas [benotai], e estes filhos [banim] são meus filhos [banai], e este rebanho é o meu rebanho, e tudo o que vês, é meu; e que farei hoje a estas minhas filhas [velivnotai], ou a seus filhos [livneihen], que deram à luz?" (Bereshit/Gênesis 31:43)

Aqui observa-se que Lavan (Labão) considerava que seus netos, filhos de suas filhas, eram seus filhos, e a ele pertenciam. Além da evidente liberalidade com o termo ‘filho’, há ainda uma curiosidade: Em uma sociedade patriarcal, isso vai além, pois não havia o conceito da transmissão direta da semente de Lavan (Labão), visto que Ya’akov (Jacó) não era filho dele.

Neste caso, Lavan (Labão) considerava que todos quantos nascessem em sua casa, visto que ele era o patriarca, eram seus filhos. Isso expressa bem um elemento da cultura semita da época.

Observa-se portanto que os laços de parentesco eram dados não apenas por filiação biológica, mas também por autoridade e posição dentro da família.


III - Semente Substitutiva

Um outro elemento interessante acerca dos laços familiares é o fato de que havia conceitos tais como o de semente substitutiva. Observe o texto abaixo:

"Então disse Yehudá a Onan: Toma a mulher do teu irmão, e casa-te com ela, e suscita descendência a teu irmão. Onan, porém, soube que esta descendência não havia de ser para ele; e aconteceu que, quando possuía a mulher de seu irmão, derramava o sêmen na terra, para não dar descendência a seu irmão." (Bereshit/Gênesis 38:8-9)

"Quando irmãos morarem juntos, e um deles morrer, e não tiver filho, então a mulher do falecido não se casará com homem estranho, de fora; seu cunhado estará com ela, e a receberá por mulher, e fará a obrigação de cunhado para com ela. E o primogênito que ela lhe der será sucessor do nome do seu irmão falecido, para que o seu nome não se apague em Israel." (Devarim/Deuteronômio 25:5-6)

Aqui observa-se o conceito de que, caso dois irmãos morassem juntos e um morresse, o outro deveria lhe dar descendentes, provavelmente visto que a semente do pai (que seria transmitida) era a mesma para ambos.

Nesses casos, o filho biológico não era considerado filho do seu gerador, mas sim de seu irmão. Ou seja, para fins de família, seu pai biológico seria considerado seu tio, e se tivesse irmão biológico, este seria considerado seu primo.

No caso das mulheres, isso era ainda mais evidente, pois era culturalmente comum que dessem suas servas para que suscitassem filhos por elas a seus maridos. Isso se vê entre as próprias matriarcas de Israel:

“E disse Sarai a Avram: Eis que YHWH me tem impedido de dar à luz; toma, pois, a minha serva; porventura terei filhos dela. E ouviu Avram a voz de Sarai.” (Bereshit/Gênesis 16:2)

“E concebeu Bil’hah, e deu a Ya’akov um filho. Então disse Rachel: Julgou-me Elohim, e também ouviu a minha voz, e me deu um filho; por isso chamou-lhe Dan.” (Bereshit/Gênesis 30:5-6)

“Depois deu Zilpah, serva de Leah, um segundo filho a Ya’akov. Então disse Leah: Para minha ventura; porque as filhas me terão por bem-aventurada; e chamou-lhe Asher.” (Bereshit/Gênesis 30:12-13)

Nesses casos, os filhos eram contados como das esposas, e não de suas servas.

Um caso ainda mais curioso é o de Naomi. Logo no princípio do livro de Ruth, é dito que seus filhos morreram, e que ela ficou sem herdeiros. Ao final do livro, quando Boaz dá um filho a Ruth, é dito:

“E as vizinhas lhe deram um nome, dizendo: A Naomi nasceu um filho [ben]. E deram-lhe o nome de Oved. Este é o pai de Yishai, pai de David.” (Ruth 4:17)

Como já visto anteriormente, os netos também eram chamados de ‘filhos’ nas Escrituras. No caso de Naomi, todavia, esse menino não tinha nenhum laço sanguíneo com ela, pois Ruth era viúva de seu filho (Rt. 1:4-5), e Boaz era parente de seu marido (Rt. 2:1). Mesmo assim, o menino foi considerado na sociedade como sendo seu filho!

Como se pode ver, tanto no caso de homens quanto de mulheres, o conceito de que alguém seria seu filho é bastante relativo nas Escrituras, se comparado ao conceito atual do filho biológico. Em todos os casos, porém, o filho é como o que hoje chamaríamos de um herdeiro direto - alguém por meio de quem a família continuaria, e na maioria das vezes a quem os bens e direitos se destinariam.

Os laços familiares não necessariamente eram idênticos aos que se está acostumado hoje, e portanto o conceito de ‘filho’ indicava muito mais um herdeiro (quer dos bens ou da semente) do que necessariamente um filho biológico. Mesmo que na maioria das vezes o herdeiro continuador fosse mesmo um filho biológico, o conceito era bem mais amplo do que isso.

Não era nem um pouco raro que o ‘filho’ não fosse biológico. Mesmo assim, para efeito da família bíblica, tinha de todos os direitos e todo o reconhecimento, bem como todas as obrigações, de um filho convencional.


IV - Filiação Tribal ou Familiar

O conceito de ‘filho’ também poderia indicar alguém que pertencesse a uma família, a um clã ou uma tribo. Isso pode ser visto em termos como o abaixo:

‘’Ora Efron habitava no meio dos filhos de Chet [benei Chet]; e respondeu Efron, heteu, a Avraham, aos ouvidos dos filhos de Chet [benei Chet], de todos os que entravam pela porta da sua cidade, dizendo:” (Bereshit/Gênesis 23:10)

“Vem agora, pois, e eu te enviarei a Faraó para que tires o meu povo, os filhos de Israel [venei Israel], do Egito.” (Shemot/Êxodo 3:10)

“Deram mais, da tribo dos filhos de Yehudá [benei Yehudá] e da tribo dos filhos de Shimon [benei Shimon], estas cidades, que por nome foram mencionadas.” (Yehoshua/Josué 21:9)

É até desnecessária a citação de muitos exemplos semelhantes aos acima, uma vez que a Bíblia contém literalmente milhares de tais exemplos, onde o termo ‘filho’ indica uma pertinência a uma tribo ou clã, uma vez que, evidentemente, tal tribo ou clã fora fundada por um patriarca.

O que deve ser levado em conta, todavia, é que a esses clãs e tribos muitas vezes havia agregados - um exemplo disso seriam pessoas, por exemplo, que se converteram e desejaram fazer parte do povo de Israel. Tais pessoas também passariam a ser contadas entre os ‘b’nei Israel’ (filhos de Israel.)


V - Usos Não-Literais

Já foi observado que sequer o uso literal do termo “filho” corresponde ao que se está habituado em nossa cultura.

Porém, é importante observar em seguida que nas Escrituras existe também um sem-número de usos do termo “filho” enquanto expressão idiomática. Esse será o próximo passo da investigação.


VI - Uso para Indicar Importância ou Afetividade

Abaixo, alguns usos demonstram que o termo “filho” também era utilizado para demonstrar importância ou proximidade. Talvez de forma parecida com o que se tem hoje em dia no próprio português ao se dizer que alguém é “como um filho.” Embora, neste caso, o uso é mais direto e parece mais abrangente:

"Então disse Sha’ul: Pequei; volta, meu filho [beni] David, porque não tornarei a fazer-te mal; porque foi hoje preciosa a minha vida aos teus olhos; eis que procedi loucamente, e errei grandissimamente... Então Sha'ul disse a David: Bendito sejas tu, meu filho [beni] David; pois grandes coisas farás e também prevalecerás. Então David se foi pelo seu caminho e Sha'ul voltou para o seu lugar." (Sh’muel Alef/1 Samuel. 26:21,25)

No episódio acima, Sha’ul (Saul) estava envergonhado por ter se levantado contra David, uma vez que esse último teve a chance de tirar-lhe a vida e decidiu poupá-lo.

Sha’ul (Saul) acima demonstra um discurso de alto conteúdo emocional. Se ele estava sendo honesto em sua fala é irrelevante para este estudo em particular, o que importa é que Sha’ul (Saul) procurou demonstrar apreço e afetividade por David, chamando-o de filho.

"Agora, filhos meus [banai], não sejais negligentes; pois YHWH vos tem escolhido para estardes diante dele para o servirdes, e para serdes seus ministros e queimadores de incenso." (Divrei HaYamim Beit/2 Crônicas 29:11)

Nesse discurso, Hizkiyahu (Ezequias) também faz um apelo carregado de forte emoção para que os levi’im (levitas) voltassem ao serviço a YHWH. Aqui, observa-se também que o termo “filhos” é usado para expressar importância ou afetividade.



VII - Importância ou Afetividade, dito por Elohim

O próprio Elohim também faz uso do termo em um contexto que parece se referir a algo que Lhe é caro ou de suma importância.

Esse termo é especialmente usado para se referir à importância e à afetividade de Elohim para com Israel:

"Então dirás a Faraó: Assim diz YHWH: Israel é meu filho [beni],  meu primogênito [vechori]." (Shemot/Êxodo 4:22)

Nesse ponto, além do termo “ben” (filho), temos também o uso do termo “bechor” (primogênito), indicando que para Elohim, de todas as nações, Israel tinha uma posição de maior destaque.

"Quando Israel era menino, eu o amei; e do Egito chamei a meu filho [livni]." (Hoshea/Oséias 11:1)

Além disso, há também referências ao povo no plural, sendo chamados de filhos pelo próprio Elohim:

"Direi ao norte: Dá; e ao sul: Não retenhas; trazei meus filhos [vanai] de longe e minhas filhas [uvenotai] das extremidades da terra. A todos os que são chamados pelo meu nome e os que criei para a minha glória, os formei, e também os fiz." (Yeshayahu/Isaías 43:7-8)

"Assim diz YHWH, o Santo de Israel, aquele que o formou: Perguntai-me as coisas futuras; demandai-me acerca de meus filhos, e acerca da obra das minhas mãos." (Yeshayahu/Isaías 45:11)

"A minha tenda está destruída, e todas as minhas cordas se romperam; os meus filhos [banai] foram-se de mim, e não existem; ninguém há mais que estenda a minha tenda, nem que levante as minhas cortinas." (Yirmiyahu/Jeremias 10:20)

O termo, todavia, não é usado exclusivamente para os filhos de Israel, mas também aparece em outros contextos, como por exemplo quando Elohim fala a David acerca de Shlomo (Salomão):

"Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho [leven]; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens." (Sh’muel Beit/2 Samuel 7:14)

"Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho [leven]; e a minha benignidade não retirarei dele, como a tirei daquele, que foi antes de ti." (Divrei HaYamim Alef/1 Crônicas 17:13)

Aqui, a relação de importância e de afeto é afirmada através da figura de linguagem de uma relação entre pai e filho.







VIII - Dezenas de Figuras de Linguagem

O termo “ben” (filho) é também objeto de dezenas de figuras de linguagem, que normalmente indica o partilhar de uma essência ou atributo. Abaixo, alguns dos principais exemplos:

"E morreu Yossef da idade [ben] de cento e dez anos, e o embalsamaram e o puseram num caixão no Egito." (Bereshit/Gênesis 50:26)

Normalmente, a Bíblia ao falar da idade de alguém, costuma dizer que a pessoa era “filho de X anos”. Acima um dos exemplos disso. Essa é uma figura de linguagem bastante comum no hebraico bíblico.

"Uns homens, filhos de Belial [benei Veliya'al], que saíram do meio de ti, incitaram os moradores da sua cidade, dizendo: Vamos, e sirvamos a outros deuses que não conhecestes;" (Devarim/Deuteronômio 13:13)

"Considera, pois, agora, e vê o que hás de fazer, porque o mal já está de todo determinado contra o nosso amo e contra toda a sua casa, e ele é um homem vil [ben Beliya'al], que não há quem lhe possa falar." (Sh’muel Alef/1 Samuel 25:17)

O significado do termo “Beliya’al” é controverso. A Enciclopédia Judaica o define da seguinte maneira:

"Um termo que ocorre frequentemente no Antigo Testamento é aplicado, pelo que se vê do contexto… a qualquer pessoa que se opusesse à autoridade estabelecida, quer civil… ou religiosa… Outro sentido mais fraco, de 'iníquo' ou 'inútil' é encontrado [em outras passagens.]"

A definição exata de “Beliya’al” não é objeto deste estudo. Para o objetivo atual, importa apenas o fato de que uma pessoa insubordinada, rebelde ou iníqua era denominada de “filho de Beliya’al”, indicando não uma filiação literal, mas sim um atributo de desobediência ou iniquidade.

"Com desdém olha todos os altivos; reina soberano sobre todos os orgulhosos [b'nei shachats]." (Iyov/Jó 41:34)

Neste trecho, os orgulhosos são chamados figurativamente de “filhos do orgulho” - ou talvez até mesmo de “filhos do leão”, uma vez que o termo “shachats” é usado para se referir ao animal. Porém, o mais importante é a observância da figura de linguagem.

"O inimigo não o importunará, nem o filho da iniquidade [uven avelá] o afligirá." (Tehilim/Salmos 89:22)

Nesse paralelismo sinônimo, o adversário do justo é justamente aquele que pratica a iniquidade, chamado figurativamente de “filho da iniquidade.”

"Estende as tuas mãos desde o alto; livra-me, e arrebata-me das muitas águas e das mãos dos estrangeiros [b'nei nechar]." (Tehilim/Salmos 144:7)

Os estrangeiros aqui são chamados literalmente de “filhos do forasteiro”, mais uma vez como figura de linguagem.

"Alegre-se Israel naquele que o fez, regozijem-se os filhos de Tsiyon [b'nei Tsiyon] no seu Rei." (Tehilim/Salmos149:2)

"Por estas coisas eu ando chorando; os meus olhos, os meus olhos se desfazem em águas; porque se afastou de mim o consolador que devia restaurar a minha alma; os meus filhos [vanai] estão assolados, porque prevaleceu o inimigo." (Eichá/Lamentações 1:16)

Além da filiação tribal, observa-se muito o uso do termo “filho” como também uma designação geográfica figurativa. Na primeira passagem, os habitantes da região de Tsiyon (Sião), isto é, de Yerushalayim (Jerusalém) são chamados de “b’nei Tsiyon”.

Já na segunda, é a própria Tsiyon (Sião) descrita de forma personificada que lamenta figurativamente por seus filhos.

"Abre a tua boca a favor do mudo, pela causa de todos que são designados à destruição [benei chalof]." (Mishlei/Provérbios 31:8)

O termo “chalof” significa algo como “que passará/desaparecerá.” Sendo assim, aqueles que serão destruídos serão chamados figurativamente de “filhos do que passará/desaparecerá.”

"Ai, nação pecadora, povo carregado de iniquidade, descendência de malfeitores, filhos corruptores [banim mash'chitim]; deixaram a YHWH, blasfemaram o Santo de Israel, voltaram para trás." (Yeshayahu/Isaías 1:4)

Não é claro aqui se a figura de linguagem é referente ao povo enquanto filho, ou se   a figura de linguagem está em chamá-los de “filhos de corruptores”, no sentido de que eram praticantes de tal coisa. De um jeito ou de outro, trata-se de figura de linguagem.

As figuras de linguagem também continuam na própria B’rit Chadashá (Novo Testamento), por exemplo nas passagens abaixo:

“Em verdade vos digo que nem mesmo em Israel encontrei tanta fé. Mas eu vos digo que muitos virão do oriente e do ocidente, e assentar-se-ão à mesa com Avraham, e Yitschak, e Ya’akov, no reino dos céus; E os filhos do reino [uv’nei hamalchut] serão lançados nas trevas exteriores; ali haverá pranto e ranger de dentes.” (Matitiyahu/Mateus 8:10-12)

Pelo contexto, observa-se que os que são chamados de “filhos do reino” são exatamente aqueles que eram naturalmente cidadãos do reino, isto é, a descendência física de Israel. A mensagem, evidentemente, é a de que ascendência biológica não garante salvação.

“Porque todos vós sois filhos da luz [b’nai nuwh’ra] e filhos do dia [uab’nai yimama]; nós não somos filhos da noite [b’nai lilya] nem filhos das trevas [b’nai cheshuwka].” (Tessalonissayah Alef/1 Tessalonissenses 5:5)

Aqui observa-se pelo próprio contexto que aqueles que praticam o que é bom e reto - chamado figurativamente de andar na luz - são chamados de “filhos do dia” e de “filhos da luz”, enquanto aqueles que praticam o que é mau e iníquo - chamado figurativamente de andar nas trevas - são chamados de “filhos da noite” e de “filhos das trevas.”


IX - Filho do Homem

Uma das expressões idiomáticas mais comuns é a expressão “filho do homem”. Ela aparece em inúmeras passagens, tais como:

“El não é homem [ish], para que minta; nem filho do homem [uven adam], para que se arrependa; porventura diria ele, e não o faria? Ou falaria, e não o confirmaria?” (Bamidbar/Números 23:10)

A palavra mais comum para “homem” nas Escrituras é “ish”. Aqui, “ish” recebe um equivalente mais figurativo de “ben adam”. Literalmente, “filho de Adam”.

“E quanto menos o homem [enosh], que é um verme, e o filho do homem [uven adam], que é um vermezinho!” (Iyov/Jó 25:6)

“Que é o homem [enosh] para que te lembres dele? e o filho do homem [uven adam], para que o visites?” (Tehilim/Salmos 8:4)

“Eu, eu sou aquele que vos consola; quem, pois, és tu para que temas o homem [enosh] que é mortal, ou o filho do homem [uven adam], que se tornará em erva?” (Yeshayahu/Isaías 51:12)

Aqui o termo mais arcaico “enosh” é usado para se referir ao homem, e novamente há um paralelismo sinônimo que o equivale a “ben adam.”

O que se observa bastante nessas expressões, bem como em inúmeras outras que, por uma questão de brevidade não foram mencionadas, é que sempre que essa expressão é citada, existe ou uma ênfase na fragilidade do ser humano, ou um contraste entre os homens e o Eterno, ou talvez entre os homens e os seres celestiais.

Isso fica bastante evidente no principal uso, no Tanach (Primeiro Testamento), da expressão - que fica por conta do Sefer Yechezkel (livro de Ezequiel. Abaixo, alguns exemplos:

“E disse-me: Filho do homem [ben Adam], põe-te em pé, e falarei contigo.” (Yechezkel/Ezequiel 2:1)

“E quanto a ti, ó filho do homem [ven Adam], eis que porão cordas sobre ti, e te ligarão com elas; não sairás, pois, ao meio deles.” (Yechezkel/Ezequiel 3:25)

“E ouvi alguém que falava comigo de dentro da casa, e um homem [ish] se pôs em pé junto de mim. E disse-me: Filho do homem [ben Adam], este é o lugar do meu trono, e o lugar das plantas dos meus pés, onde habitarei no meio dos filhos de Israel para sempre; e os da casa de Israel não contaminarão mais o meu nome santo, nem eles nem os seus reis, com suas prostituições e com os cadáveres dos seus reis, nos seus altos.” (Yechezkel/Ezequiel 43:9-10)

O texto do Sefer Yechezkel (livro de Ezequiel) está repleto dessas referências, sempre usadas para destacar o profeta, na condição de ser humano, dos seres celestiais que estavam à sua volta e que lhe falavam (o que incluir o próprio Elohim).

Mas seu uso não se restringe a Yechezkel (Ezequiel), sendo usado também em Dani’el:

“E veio perto de onde eu estava; e, vindo ele, me amedrontei, e caí sobre o meu rosto; mas ele me disse: Entende, filho do homem [ben Adam], porque esta visão acontecerá no fim do tempo.” (Dani’el 8:17)

Dani’el também traz uma passagem específica, onde há uma visão de alguém com aspecto de “filho do homem”:

“Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem [kevar enash]; e dirigiu-se ao Ancião de Dias, e o fizeram chegar até ele. E foi-lhe dado o domínio, e a honra, e o reino, para que todos os povos, nações e línguas o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que não passará, e o seu reino tal, que não será destruído.” (Dani’el 7:13-14)

Aqui a expressão usada não é “ben Adam”, e sim “bar enash”, pois é parte da porção aramaica de Dani’el. As expressões aramaicas “bar enash” ou ainda “bar nashá” são equivalentes ao hebraico “ben Adam”.

A visão aqui é claramente uma profecia messiânica. O Mashiach aqui aparece como uma figura dual. Por um lado, é poderoso e celestial - o que é indicado por sua chegada nas nuvens, estando presente perante o Ancião de Dias. Por outro, é também alguém com aspecto de humanidade.

A fragilidade indicada pela expressão “filho do homem” é também objeto de contraste com o seu domínio sobre toda a terra.


X - Conclusão sobre Filho do Homem

A percepção passada pela expressão “filho do homem” é a de se tratar não apenas de uma figura de linguagem para “ser humano”, mas também de uma expressão que enfatiza a humanidade, de certa forma expondo sua vulnerabilidade.

Dentro desse contexto, há também uma referência profética ao Mashiach, demonstrando sua natureza dual. Apesar do seu poder e grandeza, ele vem na forma de um frágil mortal.

Com essa verificação, não é difícil perceber que quando Yeshua refere a si mesmo como “filho do homem”, não está criando uma nova expressão, mas sim utilizando um conceito conhecido e bastante utilizado no Tanach (Primeiro Testamento).

Ao referir-se a Si próprio como “filho do homem”, é possível que Yeshua esteja indicando que Ele é “O” filho do homem sobre quem Dani’el profetiza, mas há muito mais do que isso.

Yeshua está claramente se utilizando de uma expressão que indica humildade. O discurso do Mashiach não é, apesar de toda a Sua glória, um discurso altivo. Pelo contrário, é um discurso humilde, que condiz com a Sua vinda na condição de servo.

É também mais do que uma mera lembrança de que Yeshua foi homem como nós, é praticamente uma identificação de Yeshua conosco. É uma forma de nos dizer: Eu sei o que você passa, porque também passei por isso.

Israel, como Filho de Elohim

Abaixo, serão analisadas algumas das referências que se faz ao povo de Israel enquanto “filhos de Elohim”:

"Filhos sois de YHWH vosso Elohim [banim atem leYHWH Eloheichem); não vos dareis golpes, nem fareis calva entre vossos olhos por causa de algum morto." (Devarim/Deuteronômio 14:1)

"Todavia o número dos filhos de Israel será como a areia do mar, que não pode medir-se nem contar-se; e acontecerá que no lugar onde se lhes dizia: Vós não sois meu povo, se lhes dirá: Vós sois filhos do El vivo. [benei El-Chai]" (Hoshea/Oséias 1:10)

Em ambos os casos, o uso da expressão parece indicar um status de importância.

O primeiro dos textos supracitados parece se utilizar do status como argumento a favor da santidade. Isto é, como se passasse pela evocação de uma missão ou autoridade especial. Algo como: Não convém para alguém que tenha o status de filho de Elohim portar-se dessa maneira.

Já o segundo também traz a mesma idéia de importância. Um povo que antes era rejeitado, agora é considerado como composto de “filhos do El vivo”. Ou seja, o contexto indica uma mudança de um status de pouca importância, para outro da máxima importância.

Os dois contextos são bem diferentes, porém o ponto em comum revela exatamente o que era desejado saber: que de alguma forma, ser “filho de Elohim” é um indicativo de algo de grande importância.
Isso confirma exatamente o uso pela importância, tal como já havia sido visto anteriormente, até mesmo em exemplos envolvendo o próprio povo de Israel, como em Ex. 4:22 e Os. 11:1, já analisados no início deste material.


XI - Os Anjos, como Filhos de Elohim

O uso mais como do termo “b’nei haElohim” nas Escrituras parece se referir aos anjos. Abaixo, os exemplos:

"Viram os filhos de Elohim [venei haElohim] que as filhas dos homens [benot ha'adam] eram formosas; e tomaram para si mulheres de todas as que escolheram. Então disse YHWH: Não contenderá a minha Ruach para sempre com o homem; porque ele também é carne; porém os seus dias serão cento e vinte anos. Havia naqueles dias gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Elohim [benei haelohim] entraram às filhas dos homens [benot ha'adam] e delas geraram crianças; estes eram os valentes que houve na antiguidade, os homens de fama." (Bereshit/Gênesis. 6:2-4)

O texto acima é objeto de muita controvérsia e disputa entre grupos religiosos, uns interpretando como anjos, e outros interpretando como se referindo à semente dos justos.

O Sefer Chanoch (livro de Enoque) afirma que se tratavam de fato dos anjos, mas não de anjos quaisquer, e sim dos chamados Sentinelas, isto é, dos anjos que tinham governo sobre o mundo e sobre os astros:

“E sucedeu que, quando os filhos dos homens haviam se multiplicado, naqueles dias lhes nasceram filhas belas e graciosas. E os anjos, os filhos do céu, as viram e cobiçaram, e disseram uns aos outros: "Vinde, escolhamos esposas para nós dentre os filhos dos homens e geremos filhos."E Shemichazah, que era o líder deles, disse a eles: "Temo que vós não concordeis de fato em fazer tal coisa, e que eu sozinho tenha que pagar a punição de um grande pecado." E todos eles responderam a ele e disseram: "Nós faremos um juramente, e nos obrigaremos por maldições para não abandonarmos este plano, mas para fazermos tal coisa." Então eles fizeram juramento juntos e se obrigaram por maldições sobre ele. E eles eram ao todo duzentos, eu desceram nos dias de Yared ao cume do monte Hermon, e eles o chamaram de monte Hermon, porque haviam jurado e se obrigado por maldições sobre ele. E estes são os nomes dos seus líderes: Shemichazah, o líder delels, Ar'tekif, segundo a partir dele, Ram'tel, terceiro a partir dele, Kokav'el, quarto a partir dele, Tami'el, quinto a partir dele, Ram'el, sexto a partir dele, Dani'el, sétimo a partir dele, Zik'el, oitavo a partir dele, Barak'el, nono a partir dele, Azaz'el, décimo a partir dele, Hermoni, décimo-primeiro a partir dele, Matr'el, décimo-segundo a partir dele, Anan'el, décimo-terceiro a partir dele, Situa'el, décimo-quarto a partir dele, Shimsh'el, décimo-quinto a partir dele, Sahr'el, décimo-sexto a partir dele, Tam'el, décimo-sétimo a partir dele, Tur'el, décimo-oitavo a partir dele, Yam'el, décimo-nono a partir dele, Zohari'el, vigésimo a partir dele. Estes são os seus chefes das dezenas.” (Chanoch/Enoque 6:1-8)

Anjos chamados de Sentinelas também aparecem em Dani’el, como o exemplo abaixo demonstra:

“Esta sentença é por decreto dos Sentinelas [Irin], e esta ordem por mandado dos santos, a fim de que conheçam os viventes que o Altíssimo tem domínio sobre o reino dos homens, e o dá a quem quer, e até ao mais humilde dos homens constitui sobre ele.” (Dani’el 4:17)

Aqui observa-se que os anjos sentinelas, ou “irin” no aramaico, são justamente aqueles que têm algum tipo de governo sobre o mundo e sobre os homens.

Se Chanoch (Enoque) os identifica como sendo esses os “filhos de Elohim” de Bereshit (Gênesis), então pode-se concluir que o termo “filhos de Elohim” se refira não apenas a anjos, mas sim a anjos em posição de destaque ou de governo.

Vale aqui ressaltar que, para o objetivo deste estudo, não cabe aqui entrar na discussão sobre a canonicidade de Chanoch (Enoque), uma vez que, para este tema em particular, isso é irrelevante, uma vez que o objetivo é a compreensão do significado da expressão idiomática. Independentemente de sua canonicidade, Chanoch (Enoque) é um livro de origem semita, e comprovadamente anterior a Yeshua. Sendo assim, mesmo para aqueles que não o considerem canônicos, a leitura demonstra o entendimento de época sobre a expressão.

A expressão também aparece em Iyov (Jó), conforme visto abaixo:

"E num dia em que os filhos de Elohim [benei haElohim] vieram apresentar-se perante YHWH, veio também Satan entre eles" (Iyov/Jó 1:6)

"E, vindo outro dia, em que os filhos de Elohim [benei haElohim] vieram apresentar-se perante YHWH, veio também Satan entre eles, apresentar-se perante YHWH." (Iyov/Jó 2:1)

"Quando as estrelas da alva juntas alegremente cantavam, e todos os filhos de Elohim [benei Elohim] jubilavam?" (Iyov/Jó 38:7)

Primeiramente, a leitura de Iyov (Jó) confirma claramente que “b’nei haElohim” é uma nítida referência a anjos.

Mas Iyov (Jó), embora não afirme explicitamente, dá indícios pelo contexto das duas primeiras citações de que esses não seriam anjos quaisquer, e sim anjos que se apresentariam na presença de YHWH regularmente.

Em outras palavras, a referência de Iyov (Jó) parece ir na mesma direção que o entendimento de Chanoch (Enoque): que a expressão “b’nei haElohim” (filho de Elohim) aponta para uma posição de governo ou, pelo menos, de destaque.

Há duas possibilidades para o significado de “b’nei haElohim” - a primeira é que o termo “b’nei” esteja sendo aplicado para se referir à natureza desses seres. Isto é, estes são aqueles que são os poderosos nos céus - aqui se admitindo “elohim” como uma palavra plural.

A outra possibilidade é a de que o significado remeta ao próprio Elohim, e o termo “b’nei” indique uma posição de destaque dada por este a tais anjos.

Ambas as leituras, pelo que foi visto do tipo de uso do termo “ben” (filho), são plenamente possíveis e, de um jeito ou de outro, acabam indicando uma posição de grande poder, ou posição destacada de governo.


XII - Os Filhos dos Poderosos

Outra expressão recorrente nas Escrituras é a expressão “b’nei Elim”, ou, literalmente, “filhos dos poderosos.” Ela aparece nas passagens abaixo:

"Dai a YHWH, ó filhos dos poderosos [benei elim], dai a YHWH glória e força." (Tehilim/Salmos 29:1)

Não é claro unicamente pelo contexto se a referência é aos líderes dos anjos, sendo assim praticamente uma expressão sinônima a “b’nei haElohim” ou se é uma referência a pessoas de destaque, isto é, governantes.

A Peshitta, neste trecho traz a enigmática - e possivelmente errônea - tradução “b’ra dekra”, literalmente, “filhos dos carneiros.”

Já a Septuaginta, e também o targum dos salmos, compreenderam a expressão como referência sinônima a “b’nei haElohim”.

"Pois quem no céu se pode igualar a YHWH? Quem entre os filhos dos poderosos [bivnei elim] pode ser semelhante a YHWH?" (Tehilim/Salmos 89:6)

Tanto pelo contexto quanto pelo paralelismo sinônimo, observa-se que essa expressão é equivalente a “b’nei haElohim.” Assim como “b’nei haElohim” deriva do termo “Elohim”, é provável que “b’nei Elim” derive de “El”.

Semelhantemente, é possível se fazer as mesmas duas leituras de “b’nei Elim” que são aceitáveis no caso de “b’nei haElohim”, uma remetendo aos poderes de forma plural, e a outra remetendo ao próprio El, considerando que o Eterno também é chamado dessa maneira.

Da mesma forma que em “b’nei haElohim”, seja qual for a leitura da origem da expressão idiomática, a conclusão é semelhante: trata-se de uma referência a anjos de destaque, por causa de seu poder ou de posição de governo.


XIII - O Filho de Elohim em Dani’el

Na porção aramaica do Sefer Dani’el (livro de Daniel), encontra-se a seguinte referência:

"Respondeu, dizendo: Eu, porém, vejo quatro homens soltos, que andam passeando dentro do fogo, sem sofrer nenhum dano; e o aspecto do quarto é semelhante ao Filho de Elohim. [levar Elahin]" (Dani’el 3:25)

As Escrituras não dão nenhum detalhe sobre o episódio do livramento dos três homens, que não o relato de Nabucodonozor através da afirmativa supracitada.

Pelo aspecto destacado do quarto homem, a única coisa que pode ser dita é que certamente Nabucodonozor o identificou por sua aparência de algum modo grandiosa. Ou seja, possivelmente Nabucodonozor quis dizer ter visto uma figura poderosa. Possivelmente aqui o uso na situação de essência, isto é, Nabucodonozor viu o que, para ele, era alguém com um aspecto de um deus ou poder celestial.

Afirmar qualquer coisa além disso seria adentrar o campo da especulação, o que seria de pouca utilidade para o estudo em questão.


XIV - O Rei de Israel, o Filho

Um uso bastante pertinente da expressão “filho de Elohim” aparece abaixo:

"Eu, porém, ungi o meu Rei sobre o meu santo monte de Tsiyon. Proclamarei o decreto: YHWH me disse: Tu és meu Filho [beni], eu hoje te gerei." (Tehilim/Salmos 2:7)

Evidentemente, existe o aspecto profético do salmo em questão, mas se o objetivo é compreender a figura de linguagem do termo “ben” (filho), é preciso resistir à tentação de ir direto à profecia, e sim buscar uma explicação a partir do próprio contexto.

Neste momento, recomenda-se que seja feita a leitura do salmo na íntegra, algo que não será reproduzido aqui por razão de brevidade.

O contexto indica a importância e a afeição de YHWH pelo rei de Israel, que é posto em contraste com os demais reis da terra.

Sua identidade é revelada logo no início do salmo:

“Os reis da terra se levantam e os governos consultam juntamente contra YHWH e contra o seu ungido [Meshicho]” (Tehilim/Salmos 2:1)

A idéia aqui da expressão idiomática “filho” é a de um governante supremo. O rei de Israel é o próprio “filho de Elohim”. Portanto, a expressão seria análoga ao conceito de Mashiach.


XV - O Filho de Elohim, em Qum’ran

Essa idéia de que um governante supremo seja chamado de “filho de Elohim” também aparece nos manuscritos de Qum’ran.

Abaixo, uma tradução na íntegra do texto do 4Q246, chamado pelos acadêmicos de “A Visão do Filho de Elohim”:

"[… um espírito de Elohim] repousou sobre ele, e ele caiu perante o trono… [Oh r]ei, a ira está vindo ao mundo, e teus anos [serão encurtados… assim] é a tua visão, e tudo dela está prestes a vir sobre o mundo. [… Em meio a] grandes [sinais], tribulação está vindo sobre a terra. [… Depois de muitas mortes] e abates, um príncipe das nações [se levantará…] o rei da Assíria e do Egito […] ele governará a terra […] se sujeitarão a ele, e todos obedecerão [a ele.]"

[Também o seu filho] será chamado O Grande, e será designado por seu nome. Ele será chamado o Filho de Elohim, eles o chamarão o Filho do Elyon. Mas como os meteoros que tu viste em tua visão, assim será o seu reino. Eles reinarão somente por alguns anos sobre a terra, enquanto povo pisoteia povo e nação pisoteia nação.

Até que o povo de Elohim se levante; então todos terão descanso da guerra. O seu reino será um reino eterno, e todos os seus caminhos serão retos. Eles julgarão a terra com justiça, e todas as nações farão shalom. A guerra cessará da terra, e todas as nações farão reverência a eles. O grande Elohim será a sua ajuda, Ele próprio lutará por eles, colocando os povos em seu poder, derrubando a todos eles perante eles. O governo de Elohim será um governo eterno e todas as profundezas [da terra são dEle.]" (4Q246)

O texto é bastante fragmentado, e portanto não há uma clara identificação do personagem histórico a que ele se refere, ou mesmo uma explicação se o termo se aplica a um rei de Israel, ou a um rei de outra nação.

Todavia, um aspecto fundamental aqui se observa: uma figura, que é um governante humano e que reina sobre as nações, é chamado de “filho de Elohim” e de “filho do Elyon.”

O uso do termo “filho” como expressão idiomática figurativa, neste ponto, certamente já não será surpresa para nenhum leitor. Observa-se que essa é uma figura altiva e conquistadora, que dominaria as nações por um período de tempo.

Em outras palavras, aqui os termos “filho de Elohim” e “filho do Elyon” ganham uma conotação ainda mais clara: não são apenas pessoas poderosas, mas sim referências ao governante supremo, àquele que teria domínio sobre as nações.


XVI - O Justo Torna-se Filho

Os textos chamados de Apócrifos também trazem algumas expressões interessantes que devem ser investigadas.

A primeira delas aparece em Ben Sirah, que afirma:

"Sê misericordioso com os órfãos como um pai; e sê como um marido para a mãe deles. E serás como um filho obediente do Elyon, que, mais do que uma mãe, terá compaixão de ti." (Eclesiástico 4:10-11)

Aqui, claramente, a expressão indica que a consequência da prática da misericórdia para com os órfãos - que estavam entre as classes mais necessitadas do povo - teria como consequência o afeto e a consideração do Elyon (Altíssimo), que retribuiria o amor. Aqui, “filho” parece indicar uma relação de afeto.

Porém, o uso mais interessante ocorre em Chochmá (Sabedoria):

"Vamos armar ciladas ao justo, porque ele nos incomoda e se opõe às nossas ações. O justo reprova as transgressões que cometemos contra a Torá, e acusa-nos de faltas contra a educação que recebemos. Declara ter o conhecimento de Elohim, e diz-se filho de YHWH. Tornou-se uma censura para os nossos pensamentos e simplesmente vê-lo já é insuportável; sua vida é muito diferente da dos outros, e seus caminhos vão em outra direção. Somos por ele comparados à moeda falsa, ele foge de nossos caminhos como de impurezas; proclama feliz a sorte final dos justos e gloria-se de ter a Elohim por Pai. Vejamos, pois, se é verdade o que ele diz, e comprovemos o que vai acontecer com ele. Se, de fato, é ‘filho de Elohim’, Elohim o defenderá e o livrará das mãos de seus inimigos." (Chochmá/Sabedoria 2:12-18)

Muitos acadêmicos apontam para o paralelo impressionante entre esse relato e a narrativa da morte de Yeshua. Mais uma vez, é importante resistir a buscar o aspecto profético neste primeiro momento, para se traçar uma análise puramente contextual do uso da expressão.

Alguns tentam estabelecer um uso da expressão “filho de YHWH” como referência ao justo, porém o texto não faz essa conexão direta. A filiação a YHWH é uma das alegações do justo.

Aparentemente, a idéia aqui é semelhante ao que aparece em Ben Sirah (Eclesiástico), bem como ao discurso de YHWH sobre Shlomo (Salomão): Aquele que obedece ao Eterno é por Ele posto em posição de apreço e de destaque. Sendo assim, ser “filho de YHWH” torna-se consequência do ser justo.

"Então o justo ficará de pé, com grande confiança, na presença dos que o oprimiram e desprezaram seus sofrimentos. Vendo-o, estes serão tomados de terrível pavor, espantados de ver sua salvação inesperada. E dirão entre si, arrependidos, entre gemidos, com o espírito angustiado: 'Este é aquele de quem outrora zombávamos, a quem cobríamos de insultos. Insensatos, consideramos a sua vida uma loucura e sua morte, uma desonra. Como, então, agora ele é contado entre os filhos de Elohim. e compartilha a sorte dos santos?'" (Chochmá/Sabedoria 5:1-5)

A idéia de que o justo tem como consequência de sua justiça o tornar-se “filho de Elohim” agora fica bastante claro.

Ou seja, o justo enquanto “filho de Elohim” significa aquele que, por meio de sua justiça, atingiu o galardão necessário para ser colocado por Elohim em posição de grande destaque, entre aqueles que serão governantes e pessoas de posição de governo no Seu Reino.

Essa idéia posteriormente seria explorada por Yochanan (João) ao afirmar:

“Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Elohim [ab’naya d’Alaha], aos que crêem no Seu nome.” (Yochanan/João 1:12)

Em outras palavras: O galardão de ser posto em posição de destaque no Reino que Yeshua teria por viver uma vida reta é conferido Àqueles que nEle crêem.


XVII - Entre Anjos e Seres Humanos

Como se pode perceber, expressões semelhantes a “filho de Elohim” pode ser aplicadas tanto a homens quanto a anjos.

A pergunta principal é: O que existe de comum entre o uso aplicado a anjos, e o uso aplicado a seres humanos?

A resposta é bem clara quando se contrastam as inúmeras referências a um e a outro: o governo ou posição de destaque.

Tanto no caso de anjos quanto no caso de seres humanos, a expressão não é usada a qualquer criatura, mas sim àqueles que, por algum motivo, estão no poder.

>>>Mais uma vitória alcançada,
Shalom Chaverim.

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